Em Santa Catarina, 72% da população está apta a votar em outubro. Mas, em 22 municípios catarinenses, o número de eleitores é maior do que o de habitantes. São cidades com, no máximo, 7 mil moradores, nas quais cada voto cresce em importância, principalmente nos pleitos municipais. O Oeste é a região com mais municípios nessa condição e é onde fica a cidade com maior desproporção.
Emancipado em 1995, Paial registra redução da população desde 2000, mas o número de eleitores praticamente não mudou. Hoje, são 1.843 aptos a votar no município, que tem 1.577 habitantes (incluindo crianças), segundo a estimativa mais recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). São 266 eleitores a mais do que residentes.
Paial foi a última cidade de Santa Catarina a contar com pelo menos um acesso pavimentado. É pequena, cujas ruas têm no máximo seis quadras, onde a tranquilidade reina. Mas tem perdido muitos jovens que saem para estudar fora, embora ainda votem onde nasceram.
– Os pais moram aqui, eles vêm nos fins de semana e ainda votam. Só eu conheço uns 20 nessa situação, entre amigos e ex-colegas de colégio – afirma o vendedor Daniel Plaut, 18 anos, que vai votar pela segunda vez neste ano.
Os moradores estão cientes que há mais votantes do que habitantes em Paial.
– Tem muita gente que mora nas cidades da região, como Seara, Chapecó e Itá, mas vota aqui. Tem gente que mora em São Paulo e tem o título aqui, assim como até jogadores de futebol amador, que são de outras cidades, votam aqui – diz o técnico agrícola e servidor municipal Antônio Soster, 53 anos, que chegou há cerca de três décadas em Paial e resolveu ficar.
Naquela época, a travessia para Chapecó, pelo rio Irani, era feita de balsa. E os 25 quilômetros da rodovia SC-157 não eram asfaltados. Em 2007, veio a ponte. Em 2014, chegou o asfalto.
A esposa dele, Darlei Fátima Castilhos Soster, 45 anos, é nascida em Paial. Ela é professora de educação física, tem 180 alunos na escola e dá aulas de dança para os adultos. Mas uma coisa que não está de acordo é com o grande número de eleitores forasteiros.
– Há pessoas que não têm mais vínculo com a cidade, que não sabem dos problemas de Paial, da nossa realidade. Quem acaba prejudicado é quem mora aqui – considera.
Para moradora, há um exagero no número de eleitores
A comerciante Arlene Mendes, 44 anos, mora em Paial desde 2005 e afirma que há um exagero no número de eleitores.
— A gente sabe que tem parentes da família de candidatos a vereador que moram em outra cidade e votam aqui por interesse, outros têm os pais aqui e mantêm o título em Paial.
Cristiane Krok Franco Casagrande, chefe do Cartório Eleitoral da 94ª Zona Eleitoral, com sede em Chapecó, diz que Paial não entrou nas últimas revisões e que há regras do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinando as revisões. Mas reconhece que o eleitorado flutuante pode prejudicar o processo.
– Nesses municípios menores, onde a população é pequena, os eleitores de fora acabam fazendo a diferença, sim. A gente tinha uma expectativa de fazer a revisão com o avanço do cadastramento biométrico, mas não tem nada programado – explica.
Paial passou para a 94ª Zona Eleitoral no ano passado. Antes, pertencia à 61ª, de Seara.
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TRE-SC dará prioridade a municípios com maior disparidade
Para coibir práticas de eleitores que fraudam o domicílio, o Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina (TRE-SC) tem como foco as eleições de 2020. Cidades onde o número de eleitores é muito maior do que o de habitantes terão prioridade nas revisões de eleitorado com biometria, previstas para ocorrer antes do próximo pleito municipal.
De acordo com a Corregedoria do TRE-SC, porém, nem sempre isso é sinônimo de irregularidade. O tribunal diz que situações assim são avaliadas “conforme a realidade local e o contexto do município”. Segundo o órgão, em algumas cidades é comum que eleitores solicitem o primeiro título no local de nascimento e, depois, mudem de domicílio para municípios maiores sem fazer a transferência. Nesses casos, não há irregularidade.
Qualquer pessoa pode denunciar diretamente ao Juízo Eleitoral da comarca, caso tenha conhecimento de fraudes. O TRE-SC orienta que os denunciantes indiquem o nome dos eleitores inscritos indevidamente para fins de averiguação e, se for o caso, para aplicação de penalidades.
O tribunal pode verificar a situação de títulos sempre que houver “denúncia fundamentada de fraude” no alistamento de uma zona ou município. Se comprovada a intenção fraudulenta, deve fazer uma revisão do eleitorado, podendo cancelar os títulos dos eleitores que não forem apresentados na revisão.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) também pode determinar a revisão, desde que três requisitos estejam preenchidos: um aumento de mais de 10% na transferência de eleitores de um ano para outro, um eleitorado pelo menos duas vezes maior do que soma da população com idade entre 10 e 15 anos e maior de 70 anos e um eleitorado superior a 65% da população estimada pelo IBGE.
Uma resolução do TSE estabelece que a revisão dos aptos a votar não deve ser feita em ano com eleições, salvo em situações excepcionais, com autorização do tribunal. O trabalho é sempre presidido pelo juiz eleitoral da respectiva zona.
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No Sul do Estado, 259 títulos foram cancelados após identificação de fraude
Dois anos atrás, o juiz eleitoral Manoel Donizete de Souza mandou cancelar 259 títulos eleitorais em Ermo, no Extremo Sul de Santa Catarina, porque os eleitores não conseguiram comprovar vínculo com o município. Em 2016, o número de cidadãos aptos a votar na cidade ultrapassava em 45% o total da população residente estimada pelo IBGE, o que reforçou a suspeita de fraude.
Quatro eleitores e uma eleitora respondem à ação penal ajuizada pelo Ministério Público, acusados de praticar o crime previsto no artigo 289 do Código Eleitoral – inscrever-se como eleitor de forma fraudulenta –, o que pode resultar em até cinco anos de reclusão, além de multa.
O processo ainda não foi julgado. Os cinco réus têm uma audiência agendada para 15 de outubro, em Turvo. Dois deles são filiados ao PSD e os outros três não têm vínculo partidário.
Tudo começou com o trabalho realizado pelos servidores da Justiça Eleitoral no município, após a suspeita levantada com os mais de 800 eleitores que pediram a transferência do domicílio eleitoral para Ermo nos anos anteriores. Em cada três deles, um teve o título cancelado.
– Vários não compareceram, outros conseguiram comprovar o vínculo com Ermo e alguns regularizaram a situação, mas com domicílio em outros municípios.
O número de eleitores em Ermo diminuiu muito depois da revisão do eleitorado. Por isso, acreditamos que muitos deles tenham se inscrito em Turvo ou Araranguá (cidades vizinhas), onde de fato residem – esclarece o chefe de cartório da 42a Zona Eleitoral, Douglas Salém.
Diário Catarinense