O vice-presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), Humberto Martins, negou nesta terça-feira (30) habeas corpus preventivo ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que fora solicitado mais cedo por sua defesa para evitar eventual prisão do petista nas próximas semanas.
Na decisão, Martins entendeu que não seria necessário conceder a liminar porque a medida só teria razão se Lula tivesse a liberdade de locomoção atualmente comprometida.
De acordo com o ministro do STJ, "o habeas corpus preventivo tem cabimento quando, de fato, houver ameaça à liberdade de locomoção, isto é, sempre que fundado for o receio de o paciente ser preso ilegalmente". O vice-presidente do STJ considera que não há "receio de ilegal constrangimento" nem "possibilidade de prisão imediata" (leia ao final a íntegra da decisão).
Lula foi condenado em junho de 2017 pela 13ª Vara Federal de Curitiba (1ª instância) a nove anos e meio de prisão, acusado de receber um apartamento tríplex no Guarujá (SP) em troca de favorecer a empreiteira OAS em contratos com a Petrobras.
Na semana passada, a 8ª Turma do TRF4 manteve a condenação e aumentou a pena para 12 anos e um mês de prisão. Durante o julgamento, o relator do processo, desembargador João Pedro Gebran Neto, em voto acompanhado pelos outros dois magistrados (Leandro Paulsen e Victor Luiz dos Santos Laus), determinou que a prisão seja executada após o TRF4 julgar todos os recursos da defesa de Lula.
O advogado Cristiano Zanin Martins, que defende o ex-presidente, criticou a decisão do STJ e afirmou que Lula tem direito de recorrer da condenação em liberdade. Em nota enviada à imprensa, o advogado voltou a criticar o julgamento no TRF4, "marcado por flagrantes nulidades". Leia o texto:
"A Constituição Federal assegura ao ex-Presidente Lula a garantia da presunção de inocência e o direito de recorrer da condenação ilegítima que lhe foi imposta sem antecipação de cumprimento de pena. A defesa usará dos meios jurídicos cabíveis para fazer prevalecer as garantias fundamentais de Lula, que não pode ser privado de sua liberdade com base em uma condenação que lhe atribuiu a prática de ilícitos que ele jamais cometeu no âmbito de um processo marcado por flagrantes nulidades. Cristiano Zanin Martins".
Prisão após condenação em 2ª instância
Ao negar o habeas corpus preventivo, o vice-presidente do STJ citou o julgamento do STF (Supremo Tribunal Federal) que autorizou, em outubro de 2016, a prisão de réus condenados na segunda instância da Justiça antes do fim de todos os recursos — após os TRFs, uma ação ainda pode tramitar no STJ e no STF.
Para Martins, uma prisão de Lula após a análise dos recursos no TRF4 não representaria "violação do princípio constitucional da presunção de inocência".
"O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o HC 126.292, passou a adotar o entendimento de que não viola a presunção constitucional de não culpabilidade a execução provisória da pena quando pendente recurso sem efeito suspensivo, como são os recursos extraordinário e especial, nos quais não há mais possibilidades de discussão acerca do fato", escreveu Martins na decisão.
Como o resultado do julgamento de Lula no TRF4 foi de 3 a 0, os advogados do ex-presidente podem apresentar ainda embargos de declaração, modalidade que não altera o conteúdo e resultado da sentença, mas apenas pede esclarecimentos sobre trechos da condenação.
Após essa fase, os advogados do ex-presidente poderão ainda entrar com recurso especial (no STJ) e recurso extraordinário (no STF), que, assim como os embargos de declaração, não tratam mais das provas e alegações que levaram à condenação.
Na petição protocolada mais cedo no STJ, os advogados de Lula alegaram que a prisão em segunda instância fere dois dispositivos da legislação brasileira e duas convenções internacionais às quais o Brasil é signatário:
"O cumprimento antecipado de pena é incompatível com: (1) o art. 5, LVII, da Constituição Federal, segundo o qual "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória"; (2) o artigo 283, do Código de Processo Penal, segundo o qual "ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva"; (3) o artigo 8.2.h da Convenção Americana de Direitos Humanos, segundo o qual "toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: (..) "h. direito de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior"; (4) os artigos 14.2 e 14.5 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, segundo o qual "14.2. Toda pessoa acusada de um delito terá direito a que se presuma sua inocência enquanto não for legalmente comprovada sua culpa;" (...) "14.5. Toda pessoa declarada culpada por um delito terá direito de recorrer da sentença condenatória e da pena a uma instância superior, em conformidade com a lei"."
Para os advogados, a decisão do STF que autorizou a prisão em segunda instância "não possui caráter vinculante" e será julgada novamente pelo Supremo.